Fernando Pessoa
Quando digo que tenho conhecimentos maçónicos,
Quando digo que tenho conhecimentos maçónicos, quero dizer, primeiro,
que sei o que é, iniciaticamente, a Maçonaria e qual o seu papel especial entre
os ritos e sistemas de iniciação; segundo, que sei o que é, socialmente, a
Maçonaria, e qual a relação, que é íntima e directa, entre o seu papel
iniciático e o seu papel social; terceiro, que conheço, tanto quanto se pode
conhecer (e não é muito) a história da formação, desenvolvimento e (...) da
Maçonaria. O mais que sei do assunto é casual e acessório, pois não disponho de
uma rede de espionagem nem convivo de hábito ou de bom grado com denunciantes.
Se me perguntarem qual é a significação do sinal abreviativo por três
pontos em triângulo, quando primeiro apareceu em documento público e por que
motivo algumas obediências maçónicas evitam o seu uso — se me perguntarem isso,
sou capaz de responder, ainda que não responda. Se me perguntarem qual a origem
e sentido do termo hebreu Kadosh, e por que motivo está ele erradamente
aplicado ao grau em cujo título figura — se me perguntarem isso, estou apto a
responder, o que não quer dizer que responda. Se me perguntarem porque é que a
Grande Loja de Inglaterra, quando, no Acto de União de 1813, decidiu que a
«pura e antiga Maçonaria» não era constituída senão pelos três graus simbólicos
e o Sacro Rial Arco (o de Zarubbabel e não o de Henoch, que é o Grau 13 do Rito
Escocês), não passou todavia a trabalhar o Rial Arco mas o entregou a um
Supremo Grande Conselho dos Maçons [?] do Rial Arco — se me perguntarem isso,
estou apto a responder, embora guarde silêncio. Todas estas coisas são da alma
e da essência da Maçonaria e, muito embora haja que colher em livros a
indicação dos factos, não é com uma ciência derivada de livros, que esses
factos podem ser coordenados e devidamente entendida e interpretada a sua
coordenação. Se, porém, me perguntarem se certo indivíduo é maçon, ou quantas
Lojas estão em actividade sob certa obediência, terei que responder, em geral,
que não sei, porque de facto o não sei. Se, por acaso, souber, digo também que
não sei.
Não lhes ocorreu que houvesse alguém que, não sendo maçon, tivesse
todavia motivos para ter para com os maçons um sentimento deveras fraternal, que
o movesse a defendê-los; que, não sendo presa de qualquer compromisso de
sigilo, pudesse fazê-lo; que, tendo os conhecimentos necessários, pudesse
fazê-lo competentemente.
O meu artigo foi somente o primeiro aviso de uma campanha a fazer; nem
sou só eu que a faço, nem é ela feita só em 4 letras.
Assim o querem? Assim o terão.
Amigos reaccionários: em guarda!
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